A crescente crise da saúde mental na Venezuela
Em crises humanitárias como no caso da nossa vizinha Venezuela, fala-se muito acerca da fome, da falta de empregos, da inflação absurda (um milhão por cento ao ano!!!), entre outros problemas que perpassam o dia-a-dia da população. Todas essas questões e suas comorbidades são importantíssimas, mas pretendemos discutir focar na esfera da saúde mental que tem pontuações sérias a serem tratadas e levadas em consideração. Um país em condições precárias como este sofre com a falta de tudo, inclusive remédios psiquiátricos.
Maria Machado, uma senhora de 60 anos e mãe de Luis Alberto Machado, de 34 anos, não consegue fazer nada normal em sua rotina, vivendo com medo do próximo ataque psicótico de seu filho. Luis tomava Sinogan (Levomepromazina maleato), mas devido a crise, o remédio está em falta, fazendo com que sua família tenha que contê-lo a força.
De acordo com Wadalberto Rodriguez, presidente da Sociedade Venezuelana de Psiquiatria, até 2013 estavam disponíveis à população cerca de 70 tipos diferentes de anti-psicóticos, mas o contexto atual do país fez com que apenas 5% destes estivessem a disposição. Tal quadro se dá mediante a falta de pagamento por parte do governo venezuelano às empresas fabricantes, que outorgou por encerrada a entrega dos subsídios. Uma das consequências mais graves desse cenário é o aumento da taxa de suicídios.
Os hospitais psiquiátricos, assim, encontram-se sobrecarregados. A falta de remédios começou em meados de 2016, quando eles atendiam em média 5 casos de emergência por dia. Em março de 2017, quando a equipe de reportagem da rede Al Jazeera estava lá, foram 20 casos somente durante a tarde.
Falta de sedativos, água, remédios, comida, papel higiênico, fraldas, entre outros suprimentos básicos para o bom funcionamento de um hospital psiquiátrico, é uma realidade para o povo venezuelano. Enquanto isso o mercado negro está em alta, com os remédios psiquiátricos sendo vendidos a "preço de ouro", o que significa que somente uma parcela mínima da população pode ter acesso a eles.
Referência
BARBARANI, Sofia. Venezuela's spiralling mental healthcare crisis. Disponível em: <https://www.aljazeera.com/indepth/features/2017/03/venezuela-spiralling-mental-healthcare-crisis-170307070622370.html>. Acesso em: 08 out. 2018.
Incêndio na Boate Kiss
Na madrugada do dia 27 de janeiro de 2013, a tragédia em Santa Maria, no Rio Grande do Sul, deixou 242 mortos e 680 feridos. Um incidente desta magnitude em uma cidade de 260 mil habitantes possui um impacto muito significativo. É quase um morto por mil habitantes.
Para enfrentar este Evento Crítico - EC, foi feita, na manhã do dia 28, uma reunião da equipe psicossocial junto aos demais membros do Gabinete de Crise. Entre os vários eixos de apoio psicossocial, destaca-se o eixo “Apoio Psicossocial”. Dentro deste eixo foi disponibilizado “suporte psicossocial aos familiares e amigos das vítimas no decurso dos velórios, missas e atos públicos”, com profissionais que estavam presentes no momento, mas que não ofereciam assistência se não fossem solicitados, respeitando o espaço de cada um. Para colaborar com as Unidades de Pronto Atendimento - UPAs e com os Serviços de Atendimento Móvel de Urgência - SAMU, “foi nomeado um grupo de psicólogos e demais profissionais de saúde voluntários que ficaram responsáveis por prestarem apoio qualificado aos profissionais que prestam serviços às vítimas. Para auxílio nos hospitais, foi organizada uma equipe voluntário de psicólogos que ofereciam ajuda aos familiares e cuidadores dos pacientes internados. Foi criado um plantão 24 horas para atender “queixas de sofrimento agudo relacionado ao evento”. Foi dado apoio às equipes de resposta, pois a maior parte deles não tinha experiência em situações semelhantes e necessitavam de apoio psicológico para lidar com o evento.
As estratégias, ações e intervenções implementadas em Santa Maria seguiram uma estrutura “condizente com as necessidades da população afetada, bem como foram coerentes com as diretrizes e políticas (inter)nacionais”. Foi possível, mesmo com as dificuldades e barreiras financeiras, desenvolver um trabalho que oferta cuidado de forma a atender as “demandas emergenciais da população afetada”.
Referência
PULINO, Lucia Helena Cavasin Zabotto et al. Estratégia de Saúde Mental e Atenção Psicossocial para Afetados da Boate Kiss. Psicologia: Ciência e Profissão, v. 36, n. 04. p. 932-945, 2016.
Gabinetes de crise para gerir a saúde mental em Portugal
Em Julho de 2018, Portugal teve um despacho assinado pelo secretário de Estado Adjunto e da Saúde, Fernando Araújo, que providencia a criação de gabinetes regionais para ajudar a gerir a saúde mental em tragédias no país. Eles serão compostos por um médico, um enfermeiro, um assistente social e um psicólogo (CAMPOS, 2018).
Os gabinetes visam coordenar as respostas necessárias e estabelecer uma estratégia de integração em caso de acidente grave ou catástrofe, independentemente da natureza e localização geográfica em que a situação se dá. O modelo tem por objetivo realizar os cuidados de saúde primários e funciona como elemento nuclear de resposta às necessidades surgidas nos primeiros dias e semanas após a situação de emergência/desastre (CAMPOS, 2018).
Toda essa mobilização se deve aos incêndios que perturbaram Portugal em 2017. Segundo notícias da página Observador (2018, web) “O relatório final da comissão de acompanhamento na área da saúde mental estima que nos territórios afetados pelos incêndios haja um aumento de 1% nas perturbações psiquiátricas graves e uma subida de 55 a 10% nas perturbações ligeiras a moderadas”.
Veja as reportagens na íntegra nos jornais que constam nas referências!
Referência
CAMPOS, Alexandra. Governo cria gabinetes regionais de crise da saúde mental. Disponível em: <https://www.publico.pt/2018/07/25/sociedade/noticia/gabinetes-regionais-de-crise-da-saude-mental-para-responder-a-catastrofes-1839011>. Acesso em: 09 out. 2018.
OBSERVADOR. Relatório prevê subida de perturbações psiquiátricas nos territórios afetados pelos incêndios. Disponível em: <https://observador.pt/2018/05/26/relatorio-preve-subida-de-perturbacoes-psiquiatricas-nos-territorios-afetados-pelos-incendios/>. Acesso em: 09 out. 2018.